Paciente abortou na 20ª semana de gestação, e bebê morreu por ‘insuficiência respiratória aguda’
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) trancou uma ação penal contra uma mulher que fez aborto. Por unanimidade, os ministros da 6ª Turma consideraram ilícita a prova contra a mulher, que proveio de denúncia da médica plantonista que fez o atendimento.
A decisão reforça a posição anterior da Corte, que já trancou ao menos uma ação criminal contra uma mulher que abortou em razão da origem da denúncia. Para o STJ, há uma relação de sigilo entre o médico e o paciente que não pode ser quebrada. Para os ministros, quem comete possível crime neste caso, é o médico e não quem abortou.
Nesse caso julgado na terça-feira 3, a mulher abortou o bebê em dezembro de 2017 depois de ingerir cinco comprimidos de medicamento abortivo. Ela passou mal e, depois do atendimento, a médica plantonista fez a denúncia à Polícia Militar.
Consta da decisão, que a mulher estava grávida de 20 semanas quando fez o aborto. Depois de tomar o remédio abortivo, pelo qual pagou R$ 400, ela “começou a sentir os efeitos do medicamento sendo socorrida por vizinhos, que a levaram ao Pronto Socorro Municipal, onde entrou em trabalho de parto e expeliu o feto ainda com vida, porém veio a falecer após doze horas”. O bebê morreu “por insuficiência respiratória aguda, anoxia neonatal grave e por prematuridade extrema ocasionada pelo aborto praticado por meio químico”, de acordo com a acusação transcrita na decisão do STJ.
Em primeira instância, o Judiciário acatou a denúncia do Ministério Público, decisão que foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, já que a autoria e a materialidade do crime estavam comprovadas. Entretanto, a Defensoria recorreu ao STJ e obteve decisão favorável.
Faltou ‘sororidade’, diz ministro do STJ, sobre denúncia feita por médica
“Deve ser assegurado à paciente o direito constitucional de não autoincriminação, não sendo possível admitir que eventual procura de ajuda médica para salvaguardar sua própria vida, em caso como o dos autos, configure, ainda que por vias oblíquas, em produção de provas contra si mesma, devendo o sigilo médico voltar-se precipuamente à proteção do direito à saúde e à intimidade da paciente”, escreveu o relator, Antonio Saldanha Palheiro.
Para o ministro Rogério Schietti, que tinha sido o relator de caso similar julgado em março e trancado a ação penal contra outra mulher que fez aborto, “faltou sororidade” da médica que fez a denúncia. “Aqui se trata de uma denúncia feita por uma profissional da saúde, uma mulher. Faltou, inclusive, sororidade”, afirmou ao julgar este último caso.
Por unanimidade, o STJ também determinou o encaminhamento do caso para o Conselho Federal de Medicina, para que investigue a médica que fez a denúncia.
STF deve julgar descriminalização do aborto
No recurso, a Defensoria Pública também pedia declaração de inconstitucionalidade do artigo do Código Penal que criminaliza o aborto. A 6ª Turma entendeu que isso invadia a competência do STF, que já analisa o caso em ação ajuizada em 2015 pelo PSOL. O partido quer a legalização do aborto até a 12ª semana de gestação.
A então ministra Rosa Weber, como um dos últimos atos à frente da presidência da Corte, pautou a ação para o plenário físico e deu voto favorável ao pedido do PSOL. O agora presidente do STF, Luís Roberto Barroso, ministro que já manifestou publicamente sua posição favorável ao aborto, pediu destaque a ação do PSOL será julgada no plenário físico da Corte, mas ainda não há data.
Com reação, o Congresso anunciou uma série de medidas para barrar o STF, a quem acusa de usurpar a competência legislativa sobre temas que deveriam ser discutidos por deputados e senadores.