Juristas criticam Moraes e dizem que Monark não violou a lei

Especialista diz que o caso do youtuber torna evidente a “normalização da censura no Brasil”

O influenciador digital Monark vem sofrendo uma devassa patrocinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que além de cerceá-lo nas redes sociais, impôs ao youtuber uma multa no valor de R$ 300 mil, alegando que ele teria descumprido decisão judicial. Para Moraes, é justificada a abertura de inquérito em desfavor de Monark por suspeita de crime de desobediência.

Juristas afirmaram que Monark não violou, nenhuma lei sequer. De acordo com os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, à luz da Constituição, além de ter sido punido injustamente em decisões pregressas, o influenciador não poderia ser objeto de investigação pelo crime de desobediência.

Doutor em Direito Constitucional pela USP, Alessandro Chiarottino afirma que o caso torna evidente a normalização da censura no Brasil. “Não há nada nos pontos elencados pelo Moraes que possa ser considerado delito perante a legislação brasileira”, advertiu.

E completou: “Temos uma situação realmente muito grave no país, hoje em dia, que é o desfazimento do modelo que foi instaurado com a Constituição de 1988. E nós não sabemos para onde estamos caminhando. Isso me parece o cerne desse fato [da decisão sobre Monark]”.

Já para o ex-juiz de Direito, Adriano Soares da Costa, a decisão do ministro Alexandre de Moraes “não cita uma única norma jurídica violada pela conduta do comunicador social” e acumula ilegalidades. Para ele, trata-se de inquérito inconstitucional, configurando censura prévia e extingue os meios laborais de subsistência do youtuber.

“São medidas extremas e inconstitucionais, sem previsão legal e com a supressão da liberdade individual sem a observância do devido processo legal, promovidas por juízo de exceção sem previsão legal”, destacou.

Soares da Costa deixou claro que se já havia uma punição prevista em caso de descumprimento da ordem judicial, não há que se falar em enquadramento de tipo penal por desobediência.

“A jurisprudência do STJ [Superior Tribunal de Justiça] tem se formado no sentido de que, quando há sanções específicas para os casos de descumprimento de medidas protetivas de urgência, que seriam a multa e a possibilidade de prisão preventiva, afasta-se a incidência do tipo penal de desobediência. Desse modo, não há tipicidade na conduta de Monark, ainda mais porque a ordem de suspensão de perfis é destinada às plataformas digitais”, observou.

Os juristas entendem que a decisão de Moraes desmonetizando todos os perfis de Monark também é inconstitucional.

Chiarottino sustenta que decisões judiciais ilegais como essas, aplicadas reiteradamente, impedem que o Brasil seja considerado uma democracia plena.

“Nós já não estamos numa situação de Estado Democrático de Direito pleno. Estamos em situação híbrida, entre um regime autoritário e o regime do Estado de Direito. É um Estado de Direito que vai negando cada vez mais os seus fundamentos – como a liberdade de expressão, o devido processo legal e o respeito à integridade física das pessoas e às suas liberdades –. Essa erosão do Estado Democrático de Direito é muito mais importante do que analisar individualmente cada caso. Porque a gente corre o risco de ficar falando eternamente, daqui a mil situações análogas a essa: “aqui não existe delito”, “isto aqui deveria ser considerado liberdade de expressão”, “essa pessoa pode ser presa por este ponto específico” etc”.

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