Em editorial, jornal que ‘criminalizou’ emendas de relator fez uma defesa veemente da liberação de verbas ao Congresso
Liberar bilhões em emendas tributárias às vésperas da votação da reforma tributária na Câmara dos Deputados, como Lula fez nos últimos dias antes de conseguir a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45/2019, faz parte do jogo democrático, informa o editorial da edição desta quarta-feira, 12, do jornal O Estado de S. Paulo.
“É do jogo democrático a distribuição de emendas parlamentares por parte de um governo para a formação de sua base no Congresso, como se viu antes da votação da reforma tributária, semana passada, na Câmara”, defendeu o Estadão, jornal que denunciou e tratou como criminoso o sistema de emendas de relator adotado no governo de Jair Bolsonaro.
Durante aquele período, o jornal chamava as emendas de “Orçamento secreto” e entendia a prática como uma política de “toma lá, dá cá”, feita sem nenhuma transparência, como um modo sujo de fazer política.
Agora, porém, entendeu que a liberação de emendas para “convencer” os deputados a votarem com o governo é um “mecanismo de recompensa” que “não tem rigorosamente nada de antirrepublicano, até porque os recursos das emendas não vão para o bolso dos parlamentares”.
“Emenda parlamentar não é pagamento de propina. É dinheiro público destinado a finalidades públicas. É equivocado, portanto, tratar a priori a distribuição de emendas como um modo sujo de fazer política”, afirma o editorial. “Não há rigorosamente nenhum problema em que parte dos recursos públicos tenha sua destinação definida por parlamentares, e não pelo Executivo. Trata-se de configuração institucional própria dos regimes democráticos, nos quais não existe Poder absoluto.”
O Estadão afirma, ainda, que os recursos das emendas “são destinados às finalidades indicadas pelo parlamentar, que responderá politicamente por isso”. As emendas de relator também tinham exatamente essa finalidade. Mas, para tentar aparentar coerência, o jornal segue afirmando que há diferença entre a liberação daquelas emendas por Bolsonaro e das atuais emendas destinadas por Lula.
“O problema das emendas parlamentares está em sua perversão, como ocorre com o chamado orçamento secreto, criado no governo Bolsonaro. Não há transparência no procedimento relativo às emendas de relator (RP-9), no qual não se sabe qual parlamentar indicou o destino da verba.”
Embora afirme que “essa opacidade estimula o mau uso dos recursos, por ineficiência, atendimento de interesses escusos ou mesmo desvio de verbas”, o jornal não cita nenhum desvio ocorrido durante o governo Bolsonaro.
O Estadão também admite que, apesar de o STF ter determinado modificações nas emendas de relator, “continua não havendo plena transparência na distribuição de várias emendas, o que merece a mais firme reprovação”. “Cumprimento de decisão judicial não é algo optativo, mas um dever”.
O jornal encerra o editorial com a afirmação de que as emendas parlamentares não devem ser criminalizadas. “Há muitas correções a serem feitas nas emendas parlamentares. Mas, para tanto, o primeiro passo é compreender seu funcionamento e seus objetivos, sem criminalizá-las”.