Lindôra apontou atos ilegais, prisões sem fundamento e práticas abomináveis no âmbito do direito
A atuação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, está sob a mira da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo. Segundo a Veja, há um documento sigiloso que pode ganhar as manchetes nas próximas semanas, em que a vice-PGR denuncia procedimentos ilegais do magistrado, prisões sem fundamento e práticas abomináveis no âmbito do direito, como a chamada “pesca probatória”, uma diligência autorizada sem um fato relevante, com o objetivo principal de obter a partir disso alguma prova aleatória de qualquer prática criminosa.
A prática denunciada por Lindôra como “pescaria”, teria sido utilizada por Moraes contra o ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, preso pela Polícia Federal no início de maio, em meio à investigação sobre falsificação de cartões de vacinação.
Na ocasião, o militar e sua esposa tiveram seus telefones apreendidos por determinação de Moraes, e a partir da suspeita de um delito menor, se chegou aos celulares deles, onde foram encontrados documentos que rascunhavam um possível golpe de Estado e mensagens de texto com retórica de igual teor. Para a vice-procuradora-geral da República, esta dinâmica de eventos se configura uma típica “pescaria” praticada por Moraes.
No entendimento dela, não havia razão para a prisão preventiva de Mauro Cid e de outros dois ex-auxiliares de Bolsonaro, Max Moura e Sérgio Cordeiro, também envolvidos na adulteração das carteiras de vacinação.
“Os elementos apontados são por demais incipientes a recomendar quaisquer diligências ou medidas em face dos investigados, sob pena de se validar a pesca probatória, à semelhança de outras investigações em curso no âmbito do Supremo Tribunal Federal”, documentou Lindôra.
Ela insinua que Moraes produziu proporção muito maior ao caso de Mauro Cid com elementos estranhos ao processo, como uma notícia publicada sobre o ex-ajudante de ordens, que estaria encarregado de pagar as despesas pessoais da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, fato sem qualquer correlação com a falsificação dos cartões de vacinação. Segundo Lindôra, o objetivo do ministro seria aumentar a desconfiança sobre o tenente-coronel e “criar um link com a prática de delitos financeiros, envolvendo o círculo social de parentes do ex-chefe do Poder Executivo”.
A vice-PGR se queixa por Moraes autorizar a varredura do email pessoal de Mauro Cid sem que haja qualquer pedido formal da Polícia Federal, cita diversas ausências das devidas formalizações dos atos processuais e indaga os instrumentos que levaram os investigadores à conclusão de que um golpe de Estado, de fato, teria sido cogitado pelo governo Bolsonaro. Em síntese, a procuradora macula todo o relatório produzido pela Polícia Federal e sugere vício investigativo.
“Trata-se de redação de cunho crítico que até poderia ser encontrada em mesas de cursinhos preparatórios para o vestibular”, achincalha a procuradora, fazendo referência aos rascunhos encontrados no telefone de Mauro Cid.
No ofício encaminhado ao temido ministro Alexandre de Moraes, Lindôra destaca que, ao determinar a prisão do ex-ajudante de ordens e de mais dois ex-assessores de confiança de Bolsonaro, o magistrado pratica a “prisão para averiguação”, uma prática abominável pelo direito e proibida, além de ter sido muito utilizada no regime militar, onde suspeitos eram presos de maneira aleatória e levados para uma unidade policial.
Quanto às mensagens encontradas no celular de Cid e as conclusões tiradas sobre elas por Moraes, a vice-PGR afirma que estas se resumem a “mero diálogo entre pessoas comuns, desprovidas de conhecimento jurídico ou político suficiente para arquitetar um golpe de Estado”. Com o descrédito sobre tais provas, Lindôra desmonta a narrativa jurídica de Moraes, já que são estas as provas que sustentam a suspeita sobre o envolvimento do ex-presidente em um plano de golpe.
Para ela, as mensagens são “uma simples troca de informações apenas e tão somente entre os interlocutores, sem contato com qualquer pessoa com condições de executar” um plano efetivo que possa ameaçar a ordem democrática.
“São posturas especulativas que poderiam ser encontradas nos dispositivos móveis de grande parte da população brasileira, sob o contexto de intensa polarização do debate político à época das eleições de 2022”.