Coronel Naime: ‘Setor operacional da PM não foi incluído em grupo de inteligência sobre 8 de janeiro’

Em depoimento, ex-chefe da PM-DF disse que ação da polícia em acampamento foi limitada pelo Exército

Durante seu depoimento à CPMI do 8 de janeiro, o coronel Jorge Eduardo Naime, ex-chefe do Departamento Operacional da Polícia Militar (Dop) do Distrito Federal, disse que o Dop não foi adicionado a um grupo de inteligência criado para a Agência Brasileira de Inteligência avisar sobre o risco de invasão nos Prédios dos Três Poderes.

“Às 10h da manhã do dia 8, a Abin confirmou que iriam acontecer manifestações violentas em Brasília”, disse Naime, nesta segunda-feira, 26, em depoimento à CPMI do 8 de janeiro. “Isso foi colocado no grupo de inteligência no WhatsApp, o Sispi, onde o Dope não estava. Estava nesse grupo o centro de inteligência da segurança pública. Esse grupo foi criado um dia antes. No momento em que não colocaram o Dope, eles nos cegaram.”

Conforme Naime, a então subsecretária de segurança, delegada Marília Alencar; o chefe da inteligência da PM, coronel Reginaldo; o chefe de inteligência do Comando Regional, Tenente Júnior; o coronel Jorge Henrique Pinto entre outros, também estavam no grupo do Sisbin.

O coronel Naime explicou que a PM tem o plano 002/2020 para conter manifestações e que o problema foi a falta de informações passadas para o Dop. “O plano é preparado para conter de dez pessoas queimando pneu até manifestações maiores do que o 8 de janeiro”, explicou. “O aviso foi dado cinco horas antes em que eles poderiam ter mudado a estratégia de segurança.”

Naime estava de folga em 8 de janeiro, quando os prédios públicos foram invadidos e depredados. Conforme disse em depoimento, ele estava com pré-diabete e, mesmo assim, foi até à Esplanada dos Ministérios para tentar conter os atos de vandalismo.

A tropa da polícia estava de sobreaviso por ordem do coronel Klepter Rosa, então sub-comandante geral da PM. Eles deveriam estar no quartel devido ao risco de invasão que rondava Brasília. Depois dos atos de depredação, Klepter foi promovido a comandante-geral da PM-DF por determinação do então interventor federal, Ricardo Cappelli.

“O coronel Klepter me ligou na minha folga e disse para eu ir para a Esplanada e prender todos o que conseguisse”, disse Naime. “Cheguei ao local por volta das 17h40, efetuei aproximadamente 400 prisões, fui atingido por um rojão e consegui desocupar os prédios dos Três Poderes antes do Cappelli chegar ao local.”

Antes de chegar à Praça dos Três Poderes, Naime disse que ligou para Cappelli a fim de se colocar à disposição. Contudo, ele não respondeu e o coronel enviou uma mensagem.

Durante a oitiva, a relatora da CPMI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), se mostrou um pouco nervosa, até mesmo, levantando a voz contra Naime. A parlamentar disse que ele estava tentando criar uma “cortina de fumaça”.

Exército impediu ação do coronel Naime nos acampamentos

Naime explicou aos parlamentares que mantinha agentes próximos e dentro do acampamento que acontecia em frente ao quartel-general em Brasília. “Estive no local por diversas vezes, mas no horário de serviço. Era parte do meu trabalho ter mais informações para a inteligência da polícia”, contou.

O coronel também declarou que já foi agredido por um agente do Gabinete de Segurança Institucional quando esteve no acampamento em frente ao quartel e que a ação da PM era limitada pelas Forças Armadas.

“Não poderíamos entrar para cumprir mandados de prisão”, disse. “A própria Polícia Federal já foi expulsa. Se meus agentes fossem identificados no acampamento, não sei o que poderia acontecer.”

Na CPMI, Naime explicou que, em 28 de dezembro, se encontrou com o general Gustavo Dutra, então chefe do Comando Militar do Planalto. O assunto do encontro, que contou com a participação de outros órgãos de inteligência, era uma operação para desmobilizar o acampamento em frente ao quartel.

“Havia informes da Polícia Civil sobre ocorrências nos acampamentos de vendas ilegais de ambulantes, de denúncias de abusos sexuais e etc”, disse. “Em 29 de dezembro, coloquei à disposição das Forças Armadas mais de 300 agentes para desmobilizar o conglomerado. Se eu falo para o general que consigo desmobilizar, é porque eu consigo. Era para desmobilizarmos todas as barracas de ambulantes e a cozinha que estava alimentando os manifestantes.”

A tentativa de Naime para desmobilizar o acampamento foi frustrada. Dutra disse a ele que a operação não iria acontecer. “Ele até me disse que eu trouxe efetivos demais”, declarou. “Fomos impedidos e não conseguimos desmobilizar nada. A PM ficou com um descrédito muito grande. Fomos impedidos pelo Exército Brasileiro.”

Diante da recusa das Forças Armadas em ajudar a PM, o coronel encaminhou documentos aos seus superiores relatando a dificuldade para desmobilizar o acampamento. “Os meus superiores devem ter levado isso à Secretaria de Segurança Pública”, continuou. “Fui informado que a liderança do movimento estava dividida: uma parte queria ir embora e outra parte queria ficar para continuar a receber Pix, na ‘máfia do Pix.’”

Fonte: Revista Oeste

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