Bolsonaro é alvo de novo erro dos checadores de informação

Agência Lupa afirma que o presidente “mentiu” ao fazer uma crítica ao jornal El País

Mais uma vez, agências de checagem e o Facebook derrapam ao classificar um conteúdo como “falso”. O alvo, desta vez, foi o presidente Jair Bolsonaro. A agência Lupa, parceira da plataforma responsável por decidir o que pode e o que não pode circular na rede social, afirma que o presidente “mentiu” ao fazer uma crítica ao jornal El País.

Na manhã da segunda-feira 26, Bolsonaro postou em seus perfis nas redes sociais um vídeo de 2019, em que os títulos de duas notícias publicadas pelo veículo espanhol apresentavam diferenças. A versão original trazia como título “Bolsonaro anima a los ejecutivos de Davos a invertir en el nuevo Brasil”. Já na edição brasileira de El País o título era “O breve discurso de Bolsonaro decepciona em Davos”.

Não é preciso ser fluente em espanhol para notar que não se trata de uma tradução com o mesmo enfoque. Embora ambas notícias se referissem ao mesmo fato, cada uma trazia um recorte diferente. Isso é conhecido na teoria do jornalismo como framing ou enquadramento e ocorre quando o editor ou o veículo escolhe contar o fato sob uma ótica específica em detrimento de outra, ou mesmo renunciando à pretensa objetividade do fato narrado.

A justificativa usada pela agência Lupa para rotular o vídeo como “falso” foi o fato de o material considerar o título da versão espanhola como “otimista” pelo uso da palavra “anima”. Segundo o dicionário da Real Academia Española, o verbo “animar” tem significados muito semelhantes às do português (veja imagem abaixo). Dado o contexto da notícia, porém, “animar a los ejecutivos” poderia ser traduzido ao português como “incentiva executivos” ou “incita executivos de Davos a investir no novo Brasil”.

Se, por um lado, existe uma lacuna sutil entre o uso da expressão “anima” em português e a aplicação em espanhol, usá-la como justificativa de que uma informação é “falsa” pode ser entendido, pelo menos, como desconhecimento semântico entre as palavras “verdade” e “mentira”. Eis uma falta grave a quem se encarrega de bater o martelo sobre o que é verdadeiro e o que é falso nas redes sociais e no ecossistema jornalístico.
Enquadramento diferencia as notícias – não apenas o verbo “anima”

O tom negativo do enquadramento dado ao fato pela versão em língua portuguesa do jornal El Pais segue na linha fina [texto que vem logo embaixo do título]. A publicação espanhola dizia: “El presidente de Brasil defiende, sin muchos detalles, el comercio por delante de la reforma fiscal y la esperada reforma del sistema de pensiones por parte de los inversores.”

Em português, se lê: “Falta de detalhes sobre medidas concretas gera frustração na audiência do Fórum. ‘Foi um pouco decepcionante, mas a verdade é que as metas que fixou foram alentadoras’, avaliava o economista-chefe da seguradora de riscos IHS.”

A edição brasileira fez um recorte do fato que usa a opinião de uma fonte para rotular a fala do presidente. O olhar de especialistas é algo bem-vindo no jornalismo. No entanto, mesmo quem não é jornalista percebe que o texto em português menciona palavras como “frustração“, “decepcionante” e “decepciona” que simplesmente não aparecem nas mesmas etapas do texto em espanhol.

Verdade ou fake?

É possível afirmar que o título em espanhol traz um tom positivo sobre o fato? Não, por conta da sutil diferença que há entre os usos corriqueiros da palavra “anima” e seus derivados no português e no espanhol.

Isso significa que a diferença entre as notícias, conforme o vídeo aponta, é falsa? De modo algum. Independentemente de qualquer equívoco na tradução da expressão “anima”, a versão da matéria em português é carregada por adjetivo, verbo e substantivo de denotação negativa.

Checadores de ideologia

Ou seja, existe diferença de enquadramento entre as notícias e não é preciso recorrer ao dicionário para notar. Afirmar que tal diferença é falsa a ponto de excluir o conteúdo só reforça a postura autoritária que as agências de fact checking vêm assumindo diante de conteúdos que não chancelem o discurso progressista.

A confusão que as agências de checagem têm feito ao rotular como fake news informações reais, declarações dadas por fontes oficiais ou retiradas de documentos públicos verídicos se tornou objeto de ação na Justiça. Sites mais alinhados à direita ou publicações de políticos conservadores são alvos de ataques desta natureza, em que a mera interpretação ideologizada dessas agências se sobrepõe à noção mais básica sobre o que é verdade e o que é mentira.

Com informações da Revista Oeste

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