‘Interferência no governo’ – Cármen vota pela derrubada de portarias que anularam anistias

STF julga validade de decretos emitidos pelo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos

A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou por derrubar mais de 300 portarias do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos que anularam anistias concedidas entre 2002 e 2005 a cabos da Aeronáutica afastados no início do regime militar.

Os atos, editados em junho de 2020 pela então chefe da pasta Damares Alves, foram fundamentados na justificativa de que não teria havido comprovação de perseguição exclusivamente política nas concessões das anistias. O posicionamento da ministra foi externado em julgamento no plenário virtual da corte, no qual os magistrados apresentam seus votos a distância.

A análise do caso teve início na última sexta-feira (29) e tem previsão para acabar no dia 6. Até o momento, somente a relatora, ministra Cármen Lúcia, se manifestou sobre o tema. As portarias assinadas por Damares foram questionadas pela Ordem dos Advogados do Brasil, que alegou “franca violação”’ ao contraditório e à ampla defesa.

Em seu voto, Cármen Lúcia considerou que a expedição das mais de 300 portarias, de forma generalizada e sem a devida individualização da situação específica de cada anistiado, contraria a segurança jurídica, o contraditório e a ampla defesa.

“Evidenciado o decurso de mais de dezessete anos entre as declarações como anistiados políticos de cabos da Aeronáutica, datadas de 2002 a 2005, e a revisão desses atos, pelos quais produzidos efeitos na esfera jurídica e de subsistência do administrado, tem-se por inconstitucionais os atos anulatórios da anistia exarados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos”, declarou.

A relatora também considerou que houve “evidente ofensa” à decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu a possibilidade de revisão de anistias de cabos da Aeronáutica, ainda que passados mais de cinco anos de sua concessão, desde que comprovada a ausência de motivação política e assegurado ao anistiado, em procedimento administrativo, com o devido processo legal.

Além disso, a ministra destacou que as portarias envolvem a cassação de benefício de natureza alimentícia, em período pandêmico. Nessa linha, a magistrada entendeu que é incompatível com as disposições constitucionais a imprescritibilidade dos atos revisionais de anistia concedidos há mais de 17 anos.

ENTENDA O QUE SÃO AS ANISTIAS

Em 1964, durante o regime militar, o Ministério da Justiça editou portaria que passou para a reserva, pelo tempo de serviço, vários cabos da Aeronáutica. Em 2002, a medida foi considerada pela Comissão de Anistia um “ato de exceção de natureza exclusivamente política”.

Assim, entre 2002 e 2006, foram expedidas pelo Ministério da Justiça várias portarias declarando como anistiados políticos cabos da Aeronáutica afastados pelo ato editado pela pasta em 1964, ano do início do regime.

Posteriormente, em 2003 e 2006, a Advocacia-Geral da União editou nota técnica sustentando que a portaria editada durante o regime militar não poderia ser considerada ato de natureza politica sem análise individualizada de cada caso.

Desde 2011, passou-se a realizar novas análises de processos administrativos que concederam anistia a cabos da Aeronáutica, o que motivou o ajuizamento de ações e mandados de segurança sobre o tema.

Em 2019, o Supremo fixou a tese de que a administração pública pode rever atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica, “quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas”.

Fonte: AE

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