“Proibiremos o Telegram no Brasil? Algo precisa ser feito”, declarou Maria Claudia Bucchianeri, em entrevista a uma revista
Em entrevista à revista Marie Claire, Maria Claudia Bucchianeri, que foi nomeada ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2021, pelo presidente Jair Bolsonaro, falou sobre a sua trajetória e as responsabilidades de seu cargo.
Ela é a nona mulher a passar pelo TSE e, atualmente, a única juíza da corte.
Maria Claudia, que também já advogou para o ex-presidente Lula, em 2018, contou que nunca imaginou que seria nomeada por Bolsonaro.
“Se tivessem me dito que Bolsonaro me nomearia ao TSE, nunca acreditaria. Sou uma mulher de fé. Acho que as pequenas coisas da minha vida foram se amarrando para culminar nisso”, falou.
Ela teve apoio de grupos evangélicos para conseguir a nomeação. Sua proximidade com comunidades religiosas ocorreu durante a tese de mestrado, que foi sobre liberdade religiosa e separação entre Estado e Igreja. Na época, a pesquisa de Maria Claudia foi orientada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que também foi um dos padrinhos da indicação dela para o TSE.
“Ninguém ainda tratava de temas religiosos. Então, acabei tendo vários clientes de diferentes igrejas. Na época, eles não apitavam em nada. As coisas mudaram muito desde então. Os evangélicos fecharam em torno do meu nome de maneira inacreditável, me carregaram no colo. Ligavam para Bolsonaro 24 horas, para a ministra Damares [Alves]”, relatou.
A advogada diz que é cristã, mas sem fazer parte de nenhuma vertente específica.
Em seu posto atual, ela é uma das responsáveis por julgar as propagandas eleitorais, incluindo o uso de fake news.
Bucchianeri foi questionada a respeito do uso do Telegram no Brasil, visto que o aplicativo é o que mais cresce e com menos regulação. Ela disse que a rede social não tem escritório no país, o que dificulta o envio de uma notificação judicial, se isto for necessário.
“O Telegram é difícil porque não tem escritório no Brasil. Não tem para onde mandar notificação judicial. Não é simples. A situação preocupa, sim. Não apenas da perspectiva eleitoral, mas de todas, com a pornografia infantil, por exemplo. O Facebook criou agora uma espécie de suprema corte da rede, para decidir sobre remoção de conteúdo. Esse filtro é feito em parte por algoritmos e há moderação humana. Os relatos de quem trabalha com a moderação são aterrorizantes. Suicídio assistido, estupro coletivo, venda de conteúdo pedófilo. Uma plataforma [sobre a qual] a Justiça não pode exercer nenhum tipo de filtro deve gerar preocupação social em todos os aspectos”.
Já como resposta a uma pergunta sobre regulação das plataformas digitais, a magistrada apontou o que seria o “problema do Telegram”.
“Isso está em debate no mundo todo: a regulação das big techs. Em 2018, o brasileiro gastou 10h on-line. É mais tempo on-line do que no mundo presencial, descontadas as horas de sono. Mais da metade da existência dos brasileiros é gasta on-line, e, dessas 10h, 5.8h são em aplicativos de celular. Podemos presumir que mais da metade são em mídias sociais, monopolizadas por três ou quatro empresas. É como se a existência do mundo estivesse concentrada em quatro governantes. Essas empresas estão nos EUA, e a legislação americana é fundada na liberdade do modelo de negócio. O nosso marco civil da internet bebeu do modelo americano; é mais solto. Há outros modelos, como o alemão, o francês. As plataformas no Brasil não são responsabilizadas pelos conteúdos que elas não geram. O Youtube hospeda conteúdo de terceiros e não será responsabilizado por aquilo, ainda que tenha uma criança sendo estuprada ali. Ele só será responsabilizado se houver uma decisão judicial determinando a remoção, e ele descumprir. Esse é o problema do Telegram. O marco civil só responsabiliza plataformas digitais se descumprirem ordens judiciais, e temos uma plataforma que não recebe ordem judicial. Isso precisa mudar. Proibiremos o Telegram no Brasil? Algo precisa ser feito”, declarou.